domingo, 4 de março de 2012

Ainda bem!

A gente demora pra aceitar, arruma novecentas desculpas para a falta de jeito do outro. Ah, ele é confuso. Ah, ele está tenso. Ah, ele tem medo. Ah, ele é maluco. Ah, ele isso. Ah, ele aquilo. Desculpa, mas quem quer estar junto pensa ah, que saudade. Ah, que falta ela me faz. Quem gosta, gosta. Sem complicações. Sem armações e armaduras. E ok, não vou mentir, tenho sentimentos de estimação por você. Mas estou deixando de alimentá-los. Um dia eles morrem.

Rodrigo:
"Ana, minha querida.
Dizem que o amor acaba. Que o amor termina. Mas não é a verdade. Nada acaba. Tudo dura, continua e transforma.
Enquanto eu aguardava aquela cirurgia, mil anos se passaram. As duas estavam lá dentro e eu pensava, se acontecer algo com as duas eu morro. Dizem que passa um filme da nossa vida na nossa cabeça e por isso, eu vi. Vi vocês duas meninas chegando à nossa casa. Vi nós três juntos ainda pequenos em tantos e tantos momentos. Vi você erguendo taças, troféus. Tua imagem na revista, inacessível. Distante da criança que eu era e que você era também. Depois a nossa fuga de casa e o nosso medo e a nossa coragem. E o salto sem rede que tantas vezes se chama amor. Vi você indo embora, sendo levada, de diferentes formas, tantas e tantas vezes. E depois vi você voltando e no fundo dos seus olhos, como num rio, tudo que a gente não tinha vivido. A partir daí eu me vi dividido entre dois amores, entre duas vidas. Uma que eu tava vivendo e a outra que eu jamais tinha podido viver. Durante os meus piores momentos enquanto eu aguardava naquela sala, como se a doença da nossa filha tivesse me curado, eu entendi que não tinha mais divisão nenhuma. O que tinha sido vivido, o que tinha ficado pra trás. Tudo era parte de uma mesma história, de uma mesma vida e de um mesmo sentimento: amor. E foi então que eu vi, nós dois juntos, cruzando a fronteira."

Ana:
"Como se tivesse alcançado a outra margem de um rio. O rio quando a gente se amou pela primeira vez, o rio do meu acidente. Mas sempre um rio. E porque naquele momento eu precisava ser forte, finalmente e sem escapes, eu consegui atravessar aquele rio eterno, como se num instante eu tivesse vivido todos os anos que ainda estavam parados em mim, me esperando. Do outro lado da fronteira que sem perceber nós já tínhamos cruzado. Uma infância compartilhada, uma adolescência trancada, uma juventude não vivida. Do lado de cá dois adultos maduros finalmente libertos daquele fardo pesado, feito de lembranças, de sonhos antigos. Por que há novos sonhos do lado de cá da fronteira. E agora, podemos viver."